terça-feira, 19 de maio de 2015

Poema 999

(ou: concepção tumular pra que ninguém alegue ignorância)

Cristiano Deveras

Quando eu morrer
escrevam no meu túmulo:
aqui dorme pio
que era poeta nas horas vagas.
O que distanciou de tudo
pra continuar mudo
com suas amarras

Aqui dorme alguém
que era de todos
e pertenceu a ninguém
que imaginava muito
mas só tinha um corpo
que casualmente se tem
que fazia poemas
só para esquecer os dilemas
do que era um e quis ser cem.

Pensando bem
escrevam mais:
aqui dorme pio
o que em sendo um
foi quase mil.

Pio Vargas (1964-1991). O poeta goiano, nascido em Iporá, foi apontado por Paulo Leminski como seu sucessor. Embora tenha morrido pouco depois do genial paranaense, deixou uma obra que, embora pequena em quantidade, é imensa na qualidade e representação da poética moderna de Goiás.

Edival Lourenço ressalta que “sua poesia é densa e trágica, própria de quem traz pela vida uma agonia congênita, irremediável, desenganada, de quem chama para si as cólicas do mundo e lhes concede uma roupagem de alto requinte”.


Texto publicado no Marco Zero ed.01.

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